Desde que tomaram forma as discussões sobre a necessidade de estimular o crescimento da economia brasileira, no final de outubro passado, o pacote de medidas a ser anunciado pelo governo passou por diversas modificações de forma e conteúdo. De medidas pontuais, para as quais o governo inclusive tentou evitar a classificação de "pacote", virou "pacote do investimento", "pacote para destravar o crescimento" e até "pacote fiscal". Mais recentemente, ganhou nome e sobrenome: Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que o presidente Lula anuncia com pompa na próxima segunda-feira.
Durante esse percurso, foram discutidas e aventadas das mais diversas possibilidades. No começo, eram basicamente medidas voltadas para aumentar a taxa de investimento: a desoneração tributária de determinados setores da economia, de forma a ampliar seus investimentos, a elevação do investimento público e o estímulo ao setor imobiliário. No final de novembro, o ministro Guido Mantega chegou inclusive a anunciar medidas pontuais de desoneração. Logo depois, sob pressão interna e externa, o governo se viu obrigado a discutir também medidas de contenção dos gastos correntes no setor público.
Nesse quesito, do ajuste fiscal, as indicações de lá para cá foram igualmente diversas. A idéia inicial, aparentemente capitaneada pelo ministro Paulo Bernardo, do Planejamento, era de aplicação de um redutor das despesas correntes como proporção do PIB, nos moldes do que o governo tentara incluir na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), de 0,1% a 0,2% do PIB. A idéia foi derrubada, e em seu lugar foi proposto um conjunto de regras de reajustes que visava reduzir o crescimento dos gastos em três rubricas específicas: o salário mínimo, a folha do funcionalismo público e os gastos com saúde.
"Esse momento foi uma espécie de auge do otimismo com o pacote do governo, em que até a ampliação da DRU e possíveis mudanças na questão da idade mínima na Previdência chegaram a ser cogitadas", lembra o economista Fábio Akira, do banco JP Morgan. "Depois disso, as medidas na área fiscal começaram a diluir: o reajuste do mínimo no ano foi superior ao que todos esperavam, com uma regra pouco ousada, a questão da Saúde foi derrubada e só sobrou o funcionalismo", completa.
Quanto aos investimentos do setor público, o canal encontrado foi a utilização e ampliação do Programa Piloto de Investimentos (PPI), projeto há tempos acordado entre governo brasileiro e Fundo Monetário Internacional (FMI). Ele permite o abatimento contábil de determinados investimentos (os com retorno fiscal de médio e longo prazos) na meta de superávit primário e terá, em 2007, seu porcentual aumentado de 0,2% para 0,5% do PIB. O mecanismo contábil, ainda que permitido por lei, nao foi utilizado no País.
Para acalmar os ânimos de quem viu na medida uma maneira de flexibilizar a política fiscal, aumentando o investimento não com corte de gastos, mas sim reduzindo o superávit primário, o ministro Mantega disse recentemente que o PPI não necessariamente reduzirá a meta do superávit. E que o governo será pródigo no contingenciamento dos gastos em 2007. Ou seja, a mesma prática adotada nos últimos anos.
Questões relacionadas ao ambiente de negócios, levantadas no fim do ano passado como parte relevante das discussões internas no governo, também apareceram durante determinado momento e acabaram saindo do foco de atenções - não se sabe ainda se por estarem devidamente resolvidas ou por terem sido abandonadas. Entram aqui mudanças no ambiente regulatório e a agilização de processos ambientais para obras de infra-estrutura.
"Seria surpreendentemente positivo se o pacote a ser anunciado na segunda tivesse medidas nas áreas de regulação, de meio ambiente, que de fato não apareceram mais no debate. Isso melhoraria de maneira importante o ambiente para os investimentos privados", afirma o diretor do Departamento de Economia do Bradesco, Octavio de Barros. Em sua opinião, o setor empresarial tende a receber bem as medidas a serem anunciadas, na medida em que aparece como principal beneficiado. Sem medidas efetivas de corte nos gastos, no entanto, o ceticismo dos economistas sobre mudanças estruturais no crescimento tendem a permanecer.
É no debate sobre os gastos - ou na ausência dele - que reside praticamente todo o ceticismo em relação aos efeitos do pacote. Que o aumento do investimento público e as desonerações tributárias irão dar mais fôlego para a economia, não há dúvida. Mas é difícil encontrar quem aposte que tais medidas, isoladamente, levarão a um crescimento da ordem de 5% ou a uma taxa de investimentos da ordem de 25% do PIB para sustentá-lo ao longo do tempo.
"É claro que ainda é muito difícil avaliar os impactos potenciais do pacote, pelo simples fato de que ainda não o conhecemos. De qualquer forma, a idéia que parece permear toda a discussão é a de aumentar os investimentos públicos de maneira importante, para que o investimento privado venha na esteira. É uma idéia com a qual boa parte dos economistas hoje não concorda", resume o economista chefe para a América Latina do ABN Amro, Alexandre Schwartsman.
Como o ceticismo em relação à ousadia fiscal do pacote é grande, a possibilidade de frustração na próxima segunda-feira, nos mercados financeiros, acaba sendo pequena. Um exemplo bem diferente, por exemplo, do "pacote 51", um conjunto de propostas de ajuste engendrado em 1997 e que, fracassado, fez crescer a maré de crises financeiras que o País vivia na época.
"Acho difícil o PAC causar frustração, pois as expectativas estão baixas. Acho que o pacote até pode ter um efeito benéfico se o governo sair com uma retórica de disciplina fiscal forte", afirmou nesta semana o diretor para América Latina do Eurásia Group, Christopher Garman.
Após a segunda-feira, em que boa parte das dúvidas relacionadas ao pacote estará devidamente resolvida, as atenções tendem a migrar para outro foco: a capacidade e a possibilidade de avanço das medidas que dependem de aprovação no Congresso, o que acabará se misturando com temas como a composição ministerial do segundo mandato do governo Lula e a postura da oposição em relação às propostas do governo, sobretudo no Senado. As respostas sobre a possibilidade de o País crescer a taxas de 5%, no entanto, levarão ainda um bom tempo.
Friday, January 19, 2007
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